sexta-feira, 10 de julho de 2020

Little Richard


Richard Wayne Penniman não nasceu em uma família que vivia o R&B intensamente como muitos de seus amigos. Ao contrário, ele foi rodeado a vida inteira pelo blues e jazz que seus pais escutavam quase todos os dias. Charlie Parker, Tab Smith, Cootie Williams, Hot Lips Page, Duke Ellington, Ella Fitzgerald, Sarah Vaughan, Dinah Washington e Georgia White são algumas das influências que esse jovem absorveu ao longo da infância e da adolescência.

E ainda havia o gospel – o cantado por Sister Rosetta Tharpe, uma das grandes cantoras do gênero nos Estados Unidos nos anos 1940 principalmente – das igrejas Pentecostal, Baptista e da African Methodist Episcopal todo final de semana por ter os irmãos, pais e parentes próximos como ministros (as pessoas que ajudam na celebração de alguma forma). Crescer nesse ambiente extremamente musical mexeu com a cabeça desse jovem nascido em Macon, Georgia, e isso o fez querer aprender a tocar piano e a cantar. Mas ele foi mais além: entrou por último na classe da aula de saxofone e foi o melhor aluno, mostrando que aprendia rápido quando o assunto era música.

Por ser pequeno, franzino e ter traços femininos, Richard ganhou o Little (pequeno) como apelido e antes mesmo de qualquer coisa, já era Little Richard para os íntimos. Um dia, antes de o culto começar, ele foi até o piano e começou a tocar músicas de Tharpe, que estava na cidade para uma apresentação. Ela estava na hora, gostou e o convidou para abrir seu show logo depois. O promotor e empresário Clint Brantley não queria deixar, mas a cantora bateu o pé e não se arrependeu. Em seu primeiro show, Little Richard mostrou o motivo de sua mãe falar que ele era "a pessoa mais musical que ela havia visto em seus anos de vida". Ele foi pago pela apresentação, e sua vida nunca mais foi a mesma.

Richard perdeu o interesse na escola e "começou a aprender música do diabo", segundo as pessoas da igreja. Era o tal do R&B, de ritmo dançante e que mexia com a cabeça das pessoas. O agora pianista profissional entrou em sua primeira banda no fim dos anos 1940, a Buster Brown's Orchestra, quando ele atuou em grupos vaudeville, muitas vezes vestido de mulher – ele ficou até o início de 1950, quando acabou seu contrato. Também foi nesse período que ele oficializou o nome Little Richard para promover-se e aproveitou para ouvir e ver nomes como Roy Brown e Billy Wright, os principais nomes do blues do início daquela década e que o influenciariam muito no início da carreira.

Quando começou a se apresentar solo, Little Richard mostrava muita energia e dava tudo de si. Isso acabou o levando a assinar um contrato com a RCA Victor para a gravação de um single, "Every Hour", primeiro lugar na região sul dos Estados Unidos. Apesar do sucesso, Richard não foi pago e logo saiu da gravadora, que o deixou pobre, sem dinheiro algum e ele precisou arrumar um emprego como lavador de pratos para pagar contas. Trocou de empresário, formou outras duas bandas e nada. Parecia estar fadado ao fracasso. Como última tentativa, por sugestão de Lloyd Price, Richard mandou um material demo para a gravadora Specialty. O pessoal gostou, o convidou para uma sessão e bater um papo. Eles começaram a gravar, mas nada que poderia fazer muito sucesso saiu disso.

Em uma noite depois das muitas tentativas, o pianista foi fazer seu show e improvisou em cima de uma letra que havia composto durante uma apresentação. Era "Tutti Frutti", o sucesso que a gravadora procurava. O produtor Robert "Bumps" Blackwell estava no momento e logo entrou em contato com a compositora Dorothy LaBostrie para trabalhar em cima do que o cantor havia feito, principalmente substituir as partes consideradas picantes.

Lançada como single em novembro, a canção explodiu e mudou a vida de todos os envolvidos ao se tornar um sucesso nos dois lados do Atlântico – uma das primeiras canções a estourar também no Reino Unido. A faixa de trabalho seguinte, "Long Tall Sally", também foi um sucesso imenso, e a carreira de Little Richard muda de patamar de vez, tornando-se o primeiro a fazer sucesso entre negros e brancos – algo inconcebível nos anos 1950 até aquele momento.

O primeiro disco dele, chamado Here's Little Richard, é a união dos Lados A e B dos singles lançados ao longo de 1956. Sendo esse um trabalho cheio, o LP chegou para o consolidar como o grande nome do rock em 1957, quando chegou ao 13º lugar da parada pop. Em pouco tempo, o cantor saiu da pobreza para virar um milionário ao fazer de suas músicas e apresentações um estouro.

Ao abrir com a dançante e sensual "Tutti Frutti", Little Richard abre o disco com o jogo ganho. De teor sensual, a letra foi alterada: o que eram versos picantes e cheios de referências ao sexo, virou uma canção agitada, dançante e perfeita para entrar na casa dos jovens sem a proibição dos pais. Um sucesso instantâneo da era romântica do rock, uma música fundamental para entender esse período.

O R&B sensual de "True, Fine Mama" traz um cantor inspirado e ajudado pelo vocal de apoio, que faz toda diferença ao criar o complemento que grudará na sua cabeça por algumas semanas. A banda faz um acompanhamento simples, bom o suficiente para dar ritmo e balanço. O blues, beirando um soul, entra em cena na romântica "Can't Believe You Wanna Leave", com um belo solo de saxofone como ponte para unir a primeira e a segunda parte.

"Ready Teddy" seria um sucesso do rock dos anos 1950, gravado pela primeira ver por Little Richard. Rápida e rasteira, era o single ideal para fazer qualquer jovem sair dançando por aí enquanto era olhado de maneira torta pelo adulto que preferia o jazz. A simples "Baby" abre caminho para o final do lado A, com "Slippin' and Slidin'" – um R&B com rock que satisfaz.

"Long Tall Sally" servia para mostrar todo ego e conhecimento musical de Little Richard. Era a música da explosão, para colocar o lugar abaixo, para fazer qualquer um – homem ou mulher – ir ao delírio durante a apresentação. Com pouco mais de dois minutos, essa canção influenciou centenas de jovens a terem suas bandas no futuro. Alterada da sua primeira versão, lenta e sem propósito, ganhou corpo em definitivo em 10 de fevereiro de 1956, data da gravação. Crua, agressiva e cheia de energia, a primeira canção do lado B é o resumo da carreira de Little Richard.

O andamento mais jazz de "Miss Ann" e "Oh Why?" coloca o trabalho em uma rotação mais lenta, mais para dançar colado com aquela pessoa que você ama. Primeiro single com a nova gravadora, "Rip It Up" é animada o suficiente para colocar o pessoal para dançar. De estrutura bem comum à época, acaba sendo outro bom exemplo de como o R&B misturou-se com o rock naquele período da história da música americana, e o mesmo exemplo cabe na ótima "Jenny Jenny" e na boa "She's Got It".

Uma obra-prima do rock, a estreia de Little Richard em estúdio é um ótimo meio para conhecer a história do início do rock nas paradas de sucesso. Se Elvis Presley era country, Richard era puro R&B. E esse jovem da Georgia deu o que falar em 1957 com esse disco primoroso.

Texto retirado de | Music on the Run

1957 | HERE'S LITTLE RICHARD

01. Tutti-Frutti
02. True, Fine Mama
03. Can't Believe You Wanna Leave
04. Ready Teddy
05. Baby
06. Slippin' And Slidin'
07. Long Tall Sally
08. Miss Ann
09. Oh Why?
10. Rip It Up
11. Jenny, Jenny
12. She's Got It

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